Crise dos opioides nos EUA pode agravar problema do subtratamento no país, onde cerca de 77 milhões de pessoas sofrem com dores crônicas e outras milhões com episódios agudos
Sinal de alerta fundamental do corpo para indicar que algo está errado, a dor também pode se transformar de sintoma em doença, com suas vítimas vivendo anos, ou mesmo décadas, em sofrimento. Mas, seja aguda ou crônica, muitos pacientes com dor em boa parte do mundo não recebem o tratamento adequado para aliviar sua aflição, correndo o risco de desenvolver outros males físicos e psicológicos, como ansiedade e depressão, que podem levar até ao suicídio.
Situação em que se enquadra o Brasil, onde o subtratamento da dor é um problema histórico e tende a se agravar diante da crise envolvendo o abuso de remédios opioides nos EUA e outros países desenvolvidos. Aqui, o medo e a desinformação tanto da parte de pacientes quanto de médicos e profissionais de saúde com relação a esses medicamentos — entre as principais ferramentas de combate à dor disponíveis —, aliados à burocracia para sua prescrição e o desconhecimento de intervenções eficazes, alternativas ou não ao seu uso, estão por trás deste subtratamento.
E não são poucas as vidas em sofrimento. De acordo com levantamento da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor (SBED), 37% da população brasileira, ou cerca de 77,1 milhões de pessoas, têm dores crônicas, isto é, que recorrem ao longo de pelo menos seis meses, sendo as mais comuns nas costas (lombalgia), articulações, cabeça (cefaleia) e as ligadas ao tratamento e padecimento de doenças como câncer e esclerose múltipla. Número que não leva em conta outras milhões de pessoas que enfrentam dores agudas resultantes destas e outras doenças, ou de ferimentos ou procedimentos cirúrgicos, que também muitas vezes não recebem o alívio necessário no país.
— São muitos os motivos que levam ao subtratamento da dor no Brasil — diz Irimar de Paula Passo, ex-presidente e conselheiro da SBED. — Começa pela opiofobia. Todo mundo acha que são drogas problemáticas, mas se o médico prescrever e receitar da forma correta, não causam problema nenhum. Outro problema é a própria formação médica. Só recentemente as faculdades começaram a introduzir disciplinas da fisiologia do tratamento da dor, tema antes espalhado pelo currículo, mas ainda assim ela ainda não é obrigatória.
E há também a questão do acesso aos medicamentos, explica Passo. Para prescrever muitos dos opioides mais fortes, o médico precisa de um receituário especial, amarelo, que deve ser obtido junto às vigilâncias sanitárias estaduais:
— Há médicos que sequer sabem que existe esse receituário. Assim, muitos profissionais nunca entraram em contato com opioides mais fortes na faculdade ou na prática clínica.
Diante da burocracia, destaca ele, é mais fácil para os médicos receitarem remédios mais fracos, os pacientes conviverem com a dor e, se não resistirem, procurarem um especialista em busca de alívio.
São profissionais como o anestesiologista com atuação em dor Paulo Renato Fonseca, que, além do conhecimento e capacidade de usar todo rol farmacológico no combate ao problema, podem lançar mão dos chamados tratamentos intervencionistas em dor, técnicas relativamente novas que vêm complementar ou mesmo substituir abordagens mais “conservadoras” dos casos, em especial das dores crônicas, que incluem desde as medicamentosas, com opioides ou não, até as tradicionais fisioterapias e reeducação postural e as alternativas, como a acupuntura.
A solução é informação, afirma Fonseca. Não só de toda a equipe de saúde, do médico à enfermeira e o auxiliar de enfermagem que lidam mais diretamente com o paciente e seu sofrimento no dia a dia no hospital, como do paciente e sua família, que têm a percepção errônea de que estes remédios são ruins e, por estigma e preconceito, condenam a si próprios e seus parentes a viverem, em alguns casos até morrer, sentindo dor.
— Não existe política pública para tratamento da dor no Brasil, desde o farmacológico até os mais modernos, intervencionistas — resume Fabrício Dias Assis, presidente do recém-realizado congresso da Sobramid e da seção Brasil do Instituto Mundial da Dor. — Para algumas dores crônicas os opioides não são a medicação adequada, e é aí que entram as técnicas intervencionistas. Com elas podemos combater o uso indiscriminado de opioides e ao mesmo tempo dar o alívio necessário aos pacientes.
Situação em que se enquadra o Brasil, onde o subtratamento da dor é um problema histórico e tende a se agravar diante da crise envolvendo o abuso de remédios opioides nos EUA e outros países desenvolvidos. Aqui, o medo e a desinformação tanto da parte de pacientes quanto de médicos e profissionais de saúde com relação a esses medicamentos — entre as principais ferramentas de combate à dor disponíveis —, aliados à burocracia para sua prescrição e o desconhecimento de intervenções eficazes, alternativas ou não ao seu uso, estão por trás deste subtratamento.
E não são poucas as vidas em sofrimento. De acordo com levantamento da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor (SBED), 37% da população brasileira, ou cerca de 77,1 milhões de pessoas, têm dores crônicas, isto é, que recorrem ao longo de pelo menos seis meses, sendo as mais comuns nas costas (lombalgia), articulações, cabeça (cefaleia) e as ligadas ao tratamento e padecimento de doenças como câncer e esclerose múltipla. Número que não leva em conta outras milhões de pessoas que enfrentam dores agudas resultantes destas e outras doenças, ou de ferimentos ou procedimentos cirúrgicos, que também muitas vezes não recebem o alívio necessário no país.
— Há médicos que sequer sabem que existe esse receituário. Assim, muitos profissionais nunca entraram em contato com opioides mais fortes na faculdade ou na prática clínica.
Diante da burocracia, destaca ele, é mais fácil para os médicos receitarem remédios mais fracos, os pacientes conviverem com a dor e, se não resistirem, procurarem um especialista em busca de alívio.
São profissionais como o anestesiologista com atuação em dor Paulo Renato Fonseca, que, além do conhecimento e capacidade de usar todo rol farmacológico no combate ao problema, podem lançar mão dos chamados tratamentos intervencionistas em dor, técnicas relativamente novas que vêm complementar ou mesmo substituir abordagens mais “conservadoras” dos casos, em especial das dores crônicas, que incluem desde as medicamentosas, com opioides ou não, até as tradicionais fisioterapias e reeducação postural e as alternativas, como a acupuntura.
Enquanto os EUA enfrentam uma crise com a superprescrição de opioides, aqui temos um subtratamento da dor que pode se agravar com estes problemas lá e em outros países desenvolvidos — conta Fonseca, atual presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Intervencionistas em Dor (Sobramid), que acaba de promover congresso multidisciplinar ligado ao tema em Campinas com a participação de cerca de 440 profissionais de diversas áreas.
— Não existe política pública para tratamento da dor no Brasil, desde o farmacológico até os mais modernos, intervencionistas — resume Fabrício Dias Assis, presidente do recém-realizado congresso da Sobramid e da seção Brasil do Instituto Mundial da Dor. — Para algumas dores crônicas os opioides não são a medicação adequada, e é aí que entram as técnicas intervencionistas. Com elas podemos combater o uso indiscriminado de opioides e ao mesmo tempo dar o alívio necessário aos pacientes.
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