Policiais e fiscais do TRE-PB entraram nos campi e apreenderam panfletos em defesa da democracia que nem citavam candidatos

No Rio, a juíza Maria Aparecida da Costa Bastos, da 199ª Zona Eleitoral (Niterói) do TRE-RJ, determinou a imediata retirada de uma faixa com os dizeres “UFF Antifascista”na fachada do prédio do curso de Direito da universidade. Ela decidiu ainda que o diretor da instituição responderia criminalmente caso não cumprisse o pedido.
Na Universidade Estadual da Paraíba, em Campina Grande, alunos e professores relatam que por dois dias (ontem e hoje) fiscais do TRE e agentes da Polícia Federal abordaram os professores sobre seus dados pessoais, a disciplina que ministram e o assunto que estava sendo abordado nas aulas. A reitoria da universidade e a associação de docentes confirmam que os homens entraram em várias aulas, entre elas uma aula de ética. Hoje, fiscais estiveram em um evento organizado pelos alunos “em defesa da democracia” e fiscais estiveram no local em busca de material de campanha.
— (A ação foi para) proibir o uso do espaço público, que é a universidade, a lei proíbe, para fazer politica partidária — explicou.
O magistrado afirmou ter recebido uma denúncia por telefone de um servidor da instituição no dia anterior de que estaria havendo panfletagem e manifestação política na universidade. A ação foi realizada no pátio da universidade, onde, segundo Melo Júnior, foram encontrados professores e membros de entidades associativas da universidade fazendo discursos contra um candidato e a favor de outro e também distribuindo panfletos.

— Não procede a denúncia de que foram fiscais em sala — afirmou o juiz, que não disse qual candidato os docentes estariam defendendo.
O magistrado determinou ainda a apreensão de um “manifesto em defesa da democracia e da universidade pública” e também “outros materiais de campanha eleitoral em favor do candidato a presidente da República Fernando Haddad”, diz o mandado de busca.
O manifesto foi elaborado pelos docentes em assembleia no dia 17 e divulgado a partir do dia 18. No documento, que não faz referência a nenhum candidato ou partido, os professores elencam dez pontos que defendem que vão desde a “liberdade de ensino e pesquisa” à “estabilidade dos servidores públicos” e à “valorização docente”.
Neste caso, de acordo com o magistrado, a denúncia foi recebida pela Polícia Federal na tarde de ontem. Cerca de “três ou quatro” professores e alunos, segundo o juiz, relataram que professores vinculados a associação estariam passando de sala em sala distribuindo o material e discursando em favor de Haddad.
— Isso vinha ocorrendo há três, quatro dias, eu estava recebendo denúncias, mas eu precisava de algo concreto. Foi quando houve a denúncia concreta de professores e alunos – explicou o juiz afirmando ainda que a denúncia “precisa sair somente de uma pessoa”.
A associação dos professores da Universidade Federal de Campina Grande afirmou, por meio de nota, que foram apreendidos pela PF dois HDs dos computadores da assessoria de imprensa da entidade e três HDs externos que estavam na associação. Em nota, sete associações e sindicatos divulgaram uma nota conjunta repudiando “ a extrapolação das autoridades responsáveis no cumprimento da lei” e afirmando esperar “imparcialidade” das autoridades na condução das ações relativas ao processo eleitoral.
Por causa das denúncias de que professores estariam pedindo votos para o PT, o juiz também enquadrou o caso no artigo 300 do Código Eleitoral que enquadra como crime o ato do servidor público que se valer de sua autoridade para coagir alguém a votar ou a não votar em determinado candidato. “Valer-se o servidor público da sua autoridade para coagir alguém a votar ou não votar em determinado candidato ou partido: pena - detenção até seis meses e pagamento de 60 a 100 dias-multa.”
Na Universidade Federal da Grande Dourados, em Dourados (MS), o TRE confimou que, com um mandado judicial, interrompeu aula sobre fascismo. O evento era uma palestra organizada pelo DCE. A denúncia foi anônima e afirmava que o evento se chamava “Esmagando o fascismo - o perigo da candidatura bolsonaro”. Em nota, o DCE nega que esse tenha sido o nome usado, sendo o verdadeiro título “Aula Pública sobre Fascismo”. Em uma publicação nas redes sociais, o DCE publicou uma nota sobre o caso, explicando que o evento já acontecia há 1 hora quando a polícia chegou. “O microfone da atividade estava livre para estudantes que se manifestavam sobre a conjuntura política, as posturas de ódio, violência e a ameaça fascista. No momento da chegada do mandado as falas foram interrompidas. A Polícia Federal também abordou integrantes do DCE, coletou nomes e tirou fotos da bandeira da nossa organização. Repudiamos esse ato de censura à liberdade de manifestação e reunião de pessoas.”
No Mato Grosso do Sul, o TRE confirmou que também cumpriu mandato proibimdo aula pública sobre fascismo.
O TRE de Minas Gerais confirmou que notificiou a Universidade Federal de São João Del Rey por uma nota que teria sido publicada no site da universidade em "repúdio ao candidato Jair Bolsonaro". Os tribunais do Pará, Bahia, Goiás e Ceará, onde também houve relatos de ações de fiscalização e apreensão nas universidades não responderam às perguntas da reportagem.
Na noite desta quinta-feira, a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, em nota, "manifestou repúdio diante de recentes decisões da Justiça Eleitoral que tentam censurar a liberdade de expressão de estudantes e professores das faculdades de Direito, que, como todos os cidadãos, têm o direito constitucional de se manifestar politicamente.A manifestação livre, não alinhada a candidatos e partidos, não pode ser confundida com propaganda eleitoral.Quaisquer restrições nesse sentido, levadas a efeito, sobretudo, por agentes da lei, sob o manto, como anunciado, de “mandados verbais”, constituem precedentes preocupantes e perigosos para a nossa democracia, além de indevida invasão na autonomia universitária garantida por nossa Constituição."
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