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Caso Lucas Terra: pastores são condenados a 21 anos de prisão por matar e queimar corpo de adolescente

 

Lucas Vargas Terra foi estuprado e queimado vivo por membros da Igreja Universal em 2001

Os pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda foram condenados a 21 anos de prisão pelo assassinato do adolescente Lucas Terra. A sentença foi proferida pela juíza Andréia Sarmento às 21h35, desta quinta-feira (27), após três dias de julgamento no Fórum Ruy Barbosa.


Em 21 de março de 2001, Lucas Vargas Terra, de 14 anos, foi estuprado e queimado vivo por membros da Igreja Universal.

Os pastores foram julgados por homicídio triplamente qualificado por motivo torpe, impossibilidade de defesa da vítima e meio cruel com o uso de fogo. O crime de ocultação de cadáver prescreveu, ou seja, encerrou o prazo legal para punir pelo crime.

Em 2012, o pastor Silvio Galiza, também acusado, chegou a ser preso e condenado a 18 anos. Entretanto, teve progressão de regime, cumpriu a pena e hoje está em liberdade condicional. Foi através do depoimento de Galiza que Fernando e Joel foram denunciados pelo Ministério Público. 


Tentativa da defesa 

Apesar do julgamento estar marcado desde 2021, houve na semana passada uma solicitação dos acusados que ameaçou adiar ainda mais o júri. A defesa dos pastores entrou com um pedido de digitalização do processo de Silvio Galiza no dia 17 deste mês.

No dia 18 de abril, o Ministério Público estadual (MP-BA) se manifestou favorável ao pedido de adiamento do julgamento dos pastores. Entretanto, a solicitação da defesa não foi para adiante e o julgamento começou na última terça-feira (25).


Igreja Universal

A Igreja Universal divulgou uma nota a respeito dos depoimentos de testemunhas durante o júri popular dos pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda. A igreja afirma que acredita na inocência de pastores. Os dois condenados têm cerca de 32 anos de vínculo com a igreja e não foram afastados.


Primeiro dia de julgamento

Primeiro dia de júri do caso Lucas Terra foi marcado por emoção e contradições de testemunhas. Após a oitiva de outras três testemunhas de acusação e uma testemunha de defesa de Joel Miranda, a última testemunha de acusação a ser ouvida foi a mãe da vítima, Marion Terra. Ela revelou que não teve apoio da Igreja Universal do Reino de Deus ou de algum dos seus pastores em nenhum momento depois da morte do filho.


Marion Terra também disse que não ficou surpresa quando Silvio Galiza, pastor auxiliar condenado por envolvimento no caso, afirmou que Fernando Aparecido da Silva e Joel Mirando tinham sido os verdadeiros assassinos de Lucas. 

"A gente sempre achava que o Galiza não tinha feito aquilo sozinho. Sempre achávamos que era o Fernando, desde o início, porque logo depois que aconteceu o crime, ele reuniu cerca de 800 obreiros cinco dias depois e proibiu que eles ajudassem nas buscas. Naquele momento, ninguém nem sabia de que forma Lucas estava, não havia nem sido encontrado o corpo ainda. Ele [Fernando] disse que eles não podiam se envolver, enquanto igreja, por causa de um Luquinhas qualquer, que um soldado morto tem que ser deixado para trás", relembrou. 

Por duas vezes, Marion chorou perante o júri ao detalhar os momentos da descoberta do desaparecimento do filho, a notícia da sua morte e a dificuldade enfrentada por ela e sua família para conseguir identificar o corpo de Lucas através de um exame de DNA que foi feito apenas 42 dias após a noite do crime, dada a dificuldade de identificação de tecidos no corpo carbonizado.


Além de Marion, logo após o recesso, quem prestou depoimento foi Sueli Santos de Jesus, assistente promovida a obreira que, à época do crime, conviveu com Lucas e foi uma das últimas pessoas que viram o garoto com vida. Às 15h10, o júri retornou do recesso e Sueli depôs como testemunha de acusação. Ela confirmou a declaração do antigo obreiro Martoni, testemunha ouvida pela manhã, reiterando que ela e outros fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus, na Santa Cruz, foram proibidos de procurar Lucas após seu desaparecimento.

Beljair de Souza Santos era o pastor à frente da Igreja na Santa Cruz na época do crime. Segundo Sueli, na noite da morte de Lucas, ela o viu ao lado de Silvio Galiza após o culto. Na ocasião, Galiza afirmou que estava aguardando para buscar alguns documentos na mão de Beljair, já que ele havia sido transferido para a igreja do Rio Vermelho naquela semana. Ela não sabe, no entanto, se esse era o real motivo para a presença de Silvio ali. 


No depoimento, Sueli ainda definiu a relação de Lucas Terra com Silvio Galiza como 'abusiva'. "Ele controlava toda a vida de Lucas. Queria mandar no menino. Eu dizia que ele parecia o pai dele, porque nunca vi uma relação igual aquela", frisou. Sueli participou das buscas, mas isso custou sua permanência na igreja. "Todos que participaram da busca acabaram expulsos", relembrou.


Convidado a depor pela defesa do pastor Joel Miranda, o pastor Beljair de Souza Santos negou a versão apresentada por Sueli, alegando que nunca reuniu os obreiros com o intuito de proibi-los a continuar na busca por Lucas Terra na época do seu desaparecimento. Ao contrário do que foi dito pela outra testemunha, ele afirmou que incentivou a procura pelo menino.

Ao ser indagado pela acusação, Beljair também disse que, quando o crime ocorreu, morava com sua esposa, o pastor Joel e a esposa dele no bairro da Pituba. A declaração apresentada contradiz o depoimento dado pelo pastor em 2008. Naquele ano, ele afirmou que na época do crime morava em uma área residencial próxima à Av. Paralela.

Pressionado por todos os lados, Beljair não respondeu se estaria sujeito à punição caso dissesse algo que comprometesse a Igreja Universal. Pastor há 30 anos, ele admitiu que sua função na igreja é sua única fonte de renda e que qualquer informação que falasse no júri a respeito de ordens recebidas por superiores seria motivo para ser chamado para uma conversa interna na instituição religiosa, a qual disse evitar.


Segundo dia

No segundo dia do júri popular foram ouvidos o pastor Allan dos Santos Bárbara, auxiliar da Igreja Universal da Pituba na época do crime, e o bispo Jadson Santos Edington, que era pastor da regional da Pituba quando o crime ocorreu. De acordo com a acusação, Fernando e Joel assassinaram Lucas porque o jovem flagrou os dois em pleno ato sexual.

Pela tarde, o Tribunal do Júri ouviu, além de Claudineia Aparecida de Freitas Silva e Eliane da Silva Miranda, esposas dos réus, Gilberto da Silva Carvalho, que era pastor da igreja do Vale das Pedrinhas, o bispo Maurício Gonzaga Amaral da Silva, antigo pastor da igreja da Catedral, a obreira Carmen Lúcia Magalhães, a administradora financeira encarregada de conferir e registrar a prestação de contas diária na Catedral, Lilian Santos da Silva Luz Sousa, e a voluntária Rosangela Dantas Costa dos Santos, que atuava na área administrativa, também na Catedral.

O pastor Gilberto da Silva Carvalho relembrou que foi o responsável pela primeira sanção de Silvio Galiza na Igreja Universal. Na época, ele era pastor da igreja no Nordeste de Amaralina e tinha Silvio como seu auxiliar, mas não estava satisfeito com suas atitudes, alegando que Silvio brincava em excesso. "Ficava abraçando homens e mulheres, brincava muito. Eu, como homem de Deus, não aprendi assim. Falava com ele e era o mesmo que nada", relatou.


Ao reportar o comportamento aos bispos, Gilberto viu Silvio ser transferido para a igreja da Santa Cruz. Um tempo depois, ele próprio foi designado a comandar a igreja do Vale das Pedrinhas, subordinada à igreja da Pituba, que tinha o pastor Joel Miranda como líder.

Segundo Gilberto, na noite do crime os suspeitos Fernando Aparecido e Joel Miranda estavam na igreja na Pituba até às 21h40 e era impossível, dado o movimento após o culto, que eles tivessem tido alguma relação sexual. "Não tem como, porque imagine, estava lá vários pastores com as esposas. Não tinha como", reiterou.

O bispo Maurício Gonzaga Amaral declarou que foi traído por Silvio Galiza quando perguntado se não desconfiava do seu caráter e afirmou que acreditava plenamente na inocência de Fernando e de Joel.

Claudineia Aparecida de Freitas Silva e Eliane da Silva Miranda, esposas dos réus, prestaram um depoimento emocionado e choraram ao lembrar o momento em que receberam a notícia de que seus respectivos maridos estavam envolvidos no caso. Ao rememorar as dificuldades enfrentadas durante a prisão de Joel, Eliane chorou. O choro comoveu Joel e Fernando que, pela primeira vez, também choraram diante dos jurados.


As testemunhas Carmen Lúcia Magalhães, Lilian Santos da Silva Luz Sousa e Rosangela Dantas Costa dos Santos e Eliane da Silva prestaram depoimento, mas responderam apenas aos questionamentos da defesa, uma vez que foram dispensadas pela acusação. 


Contradições

Durante o depoimento de Claudineia Aparecida de Freitas Silva, esposa de Fernando, houve confusão entre as equipes de defesa e acusação, que divergiram a respeito do que havia sido dito pela testemunha. De acordo com a acusação, Claudineia teria afirmado, durante depoimento no júri de Silvio Galiza, que Lucas procurou Fernando "no dia, um dia ou dois dias antes do crime" com o objetivo de buscar sua gravata, acessório que simbolizava sua formatura como obreiro, função que já desempenhava na Igreja Universal do Rio de Janeiro.

Contudo, Claudineia disse que viu Lucas pela última vez no Rio de Janeiro. A defesa rebateu a tentativa de argumentação da acusação, esclarecendo que Claudineia não havia dito que viu Lucas no depoimento anterior, mas que quem o teria visto foi seu marido. Ambas as equipes interromperam o andamento da oitiva e trocaram acusações entre si. 

Já no depoimento de Eliane da Silva Miranda, esposa de Joel Miranda, houve contradição quanto a noite do crime. Segundo Eliane, ela e Joel moravam naquela época com o pastor Beljair e sua esposa e, na noite do dia 21 de março, ela e Joel estavam em casa às 22h. No entanto, entre 22h e 22h30 acontecia todos os dias na Catedral a prestação de contas dos pastores das igrejas da região. Sendo pastor, era dever de Joel participar da prestação nesse horário, o que impossibilitava que ele estivesse em casa, conforme indicava o depoimento de Eliane. 

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